sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

O Tempo


No livro onze de suas Confissões, intitulado "O HOMEM E O TEMPO", Santo Agostinho em certo instante pergunta: o que é o tempo? E pouco depois o sábio Doutor da Igreja continua: Quem poderá explicá-lo, claro e brevemente? Quem o poderá apreender, mesmo só com o pensamento, para depois nos traduzir, por palavras, o seu conceito? Mais à frente, o bispo de Hipona diz assim: Se ninguém me pergunta, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei.

Aristóteles, o grande mestre da Filosofia, ensina-nos que o Tempo é uma das categorias acidentais do Ser. Entretanto, a simplicidade do ensinamento aristotélico, mesmo este sendo verdadeiro, não extingue o mistério existencial do Tempo, mistério que Santo Agostinho percebeu com notável intuição.

Estas considerações parecem-me oportunas , tão mais oportunas quanto mais ruidosas e agitadas sejam as comemorações habitualmente feitas na maior parte do mundo neste último dia do ano que se finda

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Reflexões à margem de um artigo


Recebi pela Internet cópia de um artigo publicado dia 24 deste mês em um de nossos principais matutinos. O autor é professor universitário e o tema por ele abordado é o do desencontro entre a comemoração do Natal e o estado em que se encontra a sociedade moderna, repleta de defeitos e injustiças que não sintonizam com a mensagem cristã.

O artigo lista vários fatos indiscutíveis; não há como negar as verdades registradas pelo professor. Entretanto, em que pesem essas veracidades, creio que seja possível, e mesmo necessário, fazermos algumas ressalvas. Vamos lá.

Comecemos lembrando certos pontos nucleares do ensinamento evangélico, em especial aquele contido nesta advertência do Cristo: " não vos preocupeis com o que haveis de comer ou beber. Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e sua justiça e o resto vos será dado em acréscimo". O comer e o beber inseridos nesta frase não devem ser lidos apenas com o seu sentido literal. Tais verbos estão ali representando todas as necessidades da criatura humana, incluindo entre elas as ligadas à nossas fome e sede de verdade, bondade e beleza.

Infelizmente, o autor do artigo ora comentado não fez nenhuma referência à origem histórica dos atuais problemas que ele - com muita razão - expôs. Não lembrou, por exemplo, o fato de ter havido na Europa, depois da queda do Império Romano, uma civilização que olhava a existência com olhos de criança, conforme escreveu o historiador judeu Egon Friedell em seu livro "A Cultural History of Modern Time". Uma civilização que ergueu as grandes e belas catedrais de pedra, que reconheceu a dignidade da mulher, que honrou o trabalho manual e criou a instituição da Universidade.

Teria sido muito bom se o professor tivesse dito que os atuais problemas do Ocidente moderno têm sua raíz mais profunda na época em que se apagou a grande luz do Medievo.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O maior dos desafios


Dentro de três dias os cristãos deverão estar comemorando o Natal. Esta frase fica melhor entendida se a substituirmos por esta outra: "dentro de três dias os cristãos estarão comemorando o Natal." A primeira corresponde a uma expectativa, a segunda fala de uma certeza.
Fazer esta introdução, um tanto ou quanto retórica, parece-me adequado diante da realidade em que, há alguns séculos, vem vivendo o Ocidente.

Desde a sua origem, há mais de dois mil anos, a mensagem cristã em sua essência não propõe aos homens um código de moral sublime, nem um habilidoso plano para viver nosso dia a dia sem grandes problemas. Ela apresenta, sim, um desafio, o maior dos desafios. Cada um de nós precisa responder, com uma honestidade e uma coragem semelhantes àquelas de São Paulo na estrada de Damasco, a esta nuclear pergunta:
- "quem é de fato Jesus Cristo para mim?"

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Lembrando antigo ditado


Não convém emprestar aos ditados, provérbios ou aforismos um valor exagerado. Entretanto, eles muitas vezes servem como oportunos lembretes, especialmente em certas desconfortáveis circunstâncias da nossa existência. Um desses ditados afirma : "há males que vêm para bem". Lembrei-me desta frase depois de receber, pela Internet, uma mensagem a respeito de um filme baseado em livro escrito pelo ateísta militante Philip Pullman.

Como nunca tinha ouvido falar nesse escritor, recorri aos recursos informativos do Google. De fato, o citado autor tem mesmo uma assumida posição anti-cristã. Quem me enviou aquela mensagem mostrava-se seriamente preocupado, não sem razão, com o nefasta influência que o tal filme poderá exercer na consciência de milhares de inocentes crianças.

Neste momento, algum eventual leitor deste blog poderá perguntar: "qual seria o bem advindo desse sombrio fato ora divulgado na Internet?"

Respondendo a esse hipotético leitor, direi que nós, cristãos, deveríamos todos os dias, em todas as horas, em todos os instantes, nos lembrarmos de que nossa fé não se baseia essencialmente em um código de sublimes regras morais. Nossa crença tem seu fundamento em uma pessoa, um homem que viveu neste mundo há mais de dois mil anos. Nossa crença afirma que devemos amar esse mesmo homem porquanto ele é o próprio Deus encarnado. Um Deus onipotente e onipresente, que nos ama, que nos criou livres e que respeita a nossa liberdade, inclusive a liberdade do senhor Philip Pullman. Lembrar tudo isso é um indiscutível bem.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Um livro que incomoda


Já escrevi neste blog sobre um importante livro que, na minha opinião, teria sido injustamente colocado no ostracismo. Refiro-me ao livro DOIS AMORES, DUAS CIDADES. Durante vários anos coloquei tal injustiça na conta de muitos de nossos eclesiásticos, aborrecidos com as críticas que o autor do livro fez contra os novidadeirismos introduzidos na Igreja. Nestes dias mais recentes veio-me à lembrança que, além desses homens acima citados, outros existem que têm seus próprios motivos para não desejar a divulgação daquela obra tão significativa. Os antigos já diziam : Veritas odium parit, a verdade gera o ódio.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Um velho equívoco


No século XX ficou famosa a expressão la politique d'abord, cunhada pelo irrequieto pensador e político francês Charles Maurras (falecido em 1952).
Ensina-nos a boa e antiga doutrina que a finalidade da Política, com P maiúsculo, deve ser o Bem Comum, entendido ele não apenas como um somatório de bens distribuídos com justiça entre os membros de uma sociedade, mas, sobretudo, como uma atmosfera cultural que incentiva os bons a se tornarem melhores e constrange os maus para que não se tornem piores. O cristão autêntico deve não só defender essa correta concepção de Bem Comum como trabalhar, tanto quanto lhe for possível, para que ela seja colocada em prática.

Acontece - e não é de hoje - que a Política é mesmo um tema apaixonante, tanto para gregos como para troianos. Um católico, mesmo posuidor de ótima escolaridade e não inferior cultura, pode eventualmente aderir a essa paixão e, sem sentir, acabar cometendo o perigoso equívoco de Maurras. No fundo, é a quebra de uma desejável hierarquia, aquela que sabiamente coloca a moral subordinada à contemplação do Eterno.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A blindagem - II


Terminou a recente eleição para Presidente. Observando agora muitos fatos, políticos e não políticos, e também lendo e ouvindo vários comentários feitos por muita gente, dentro e fora da Internet , somos obrigados a repetir, e agora com maior convicção: existe uma dura blindagem entre o Ocidente e suas raízes históricas. Uma leitura atenta do Evangelho nos lembra que o próprio Cristo já prevenira seus discípulos sobre os tempos futuros . Sem dúvida alguma esses tempos futuros são os nossos. Que Deus tenha piedade de nós.

Este tempo do Advento é bem oportuno para reflexões como estas.